sábado, 12 de setembro de 2009

Mediocridade

Medíocres... para chegar ao topo

Burocratas, como Durão Barroso e Ban Ki-moon, são postos à frente de instituições internacionais por conveniência de Chefes de Estado e Governo

O sorriso de José Manuel Durão Barroso tornou-se deslavado e inseguro. De tempos a tempos, este seu habitual sorriso desaparece e um véu acizentado parece velar-lhe o rosto bronzeado. Esta é uma fase complicada para o Presidente português da Comissão Europeia e entrar no recém-eleito Parlamento Europeu em Estrasburgo, no dia 15 de Julho, foi uma experiência particularmente difícil.
Foi no dia em que se esperava que Durão Barroso fosse eleito para mais um mandato de cinco anos à frente do quartel-general da União Europeia, em Bruxelas. Era o que estava previsto no guião escrito durante a última reunião de Chefes de Estado e de Governo. Mas o Parlamento decidiu fazer-se difícil, tendo os membros do Partido Os Verdes e os sociais-democratas decidido adiar a votação.
A próxima oportunidade para eleger Durão Barroso será a 15 de Setembro, mas talvez então nada aconteça, já que também alguns correligionários democratas cristãos começaram a distanciar-se do seu candidato.
Durão Barroso tornou-se numa figura tragicómica. Já quase ninguém o tem em grande conta. Na verdade, há agora muita gente que o critica e espalha calúnias maliciosas acerca das suas tentativas desesperadas para conseguir o apoio dos seus antigos defensores. Um destes, a chanceler alemã Angela Merkel, que em tempos o ajudou a conseguir a nomeação, ridiculariza-o agora por recorrer tantas vezes a ela. Membros do gabinete da ministra sueca dos Assuntos Europeus, Cecilia Malmstrõm, também fizeram comentários depreciativos sobre Barroso.
Este deixou de ter qualquer autoridade significativa, se é que alguma vez a teve. A questão que se coloca é saber por que motivo os líderes europeus o escolheram? E por que razão troçam agora dele e o deixam cair, como se a sua posição fosse meramente acessória e não um cargo proeminente dentro da UE, uma grande potência económica com aspirações a ser uma potência política? A razão é óbvia, diz um dirigente da Europa do Sudeste: a UE agarra-se a este homem, conhecido pela sua fraqueza, por razões de conveniência e porque a procura de uma alternativa iria provavelmente desencadear maiores conflitos.
Na verdade, políticos como Angela Merkel e o Presidente francês, Nicolas Sarkosy, valorizam a sua superioridade em relação ao Presidente da Comissão Europeia. Se fosse um dos seus pares, um homem como o francês Jacques Delors, que dirigiu a Comissão entre 1985 e 1995 com um misto de ambição e panache, e que foi justamente alcunhado de «Sr. Europa», a UE não seria o tipo de organização que os grandes países conseguem controlar em benefício próprio.
Barroso não levanta este tipo de problemas aos líderes francês e alemão. Dele não se esperam propostas sobre os limites da expansão ou sobre um «núcleo forte» europeu, que pudesse liderar uma organização que cresceu significativamente nos últimos anos.
É óbvio que esta gritante falta de iniciativa ao mais alto nível não é benéfica para uma instituição como a UE, num momento em que esta enfrenta uma grave crise económica e está cada vez mais a ser marginalizada por um Presidente americano que domina a cena mundial.
Não serve de consolo o facto de outras organizações importantes, que tentam desempenhar um papel na política mundial, terem optado por uma abordagem semelhantes. O desequilíbrio entre os princípios e a liderança é actualmente gritante nas Nações Unidas, onde o Secretário-Geral, Ban Ki-moon, um sul-coreano, é sobretudo um gestor e não um líder. Do mesmo modo, a NATO e o Banco Mundial também aplicaram o critério da discrição à escolha dos seus actuais secretários-gerais.
Estes dirigentes são o produto de uma forma de pensar equilibrada. A sua selecção assenta no princípio da mediocridade e eles são incapazes de estar à altura das possibilidades que os seus cargos oferecem. Porém, concretizar as potencialidades desses cargos parece ser exactamente aquilo que os países e líderes nacionais que os escolheram não querem que eles façam.
Há cinco anos, a Comissão Europeia poderia ter tido uma alternativa a Durão Barroso: o político belga Guy Verhofstadt, um homem que pensa pela sua cabeça, com experiência e determinado a não desempenhar um papel secundário. O então chanceler Gerhard Schroeder fez campanha a seu favor, mas, em 2004, o percurso político de Schroeder já estava em declínio, o que permitiu a Angela Merkel agarrar a sua oportunidade. Esta mobilizou os líderes europeus conservadores e derrotou Schroeder. Durão Barroso, então primeiro-ministro português, não era o melhor candidato mas tinha ambições modestas - e foi isso que contou.
(…)
Ban Ki-moon, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros da Coreia do Sul, é Secretário-Geral da ONU há dois anos e meio. Na sede da organização, em Nova Iorque, e não só, é visto como uma desilusão e como o homem errado para assumir um cargo de destaque e liderar a comunidade global, num período em que o eixo político mundial está a deslocar-se da América para a Ásia. Sempre se disse que Ban Ki-moon está mais interessado em ser secretário do que ge(ne)ral, e é exactamente isso que ele é hoje.
(…)


Der Spiegel

Ralf Beste, Klaus Brinkbäumer, Manfred Ertel,
Rüdiger Falksohn, Hans-Jürgen Schlamp

(Jornal alemão, Munique)

Publicado na edição portuguesa de Setembro do Courrier Internacional

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